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Anistia: inconstitucional e perversa

Oscar Vilhena Vieira

Professor da FGV Direito SP, mestre em direito pela Universidade Columbia (EUA) e doutor em ciência política pela USP. Autor de "Constituição e sua Reserva de Justiça" (Martins Fontes, 2023)

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Como permitir que mera lei ordinária assegure a impunidade daqueles tentaram abolir o Estado democrático de Direito?

 

Uma das poucas vantagens de ter uma história constitucional acidentada é a oportunidade de aprender com o passado. Após o pesadelo da ascensão do nazismo, que corroeu por dentro a Constituição de Weimar, os alemães entenderam que era necessário blindar a nova constituição contra futuros ciclos autoritários.

De acordo com o artigo 79 (3) da Lei Fundamental, são inadmissíveis alterações constitucionais que afetem os princípios da dignidade humana, do estado democrático de direito ou da federação. Lá se vão mais de 75 anos de uma democracia que ressurgiu das cinzas, demonstrando uma incrível capacidade de se defender de se seus inimigos.

Uma grande multidão de pessoas está reunida, todas fazendo gestos de coração com as mãos. A maioria das pessoas está vestida com roupas nas cores verde e amarelo, representando o Brasil. O ambiente é festivo, com algumas pessoas segurando celulares e outras com bandeiras. O público parece animado e engajado.
Apoiadores de Jair Bolsonaro participam de protesto pela anistia a condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023, na avenida Paulista – Miguel Schincariol – 6.abr.25/AFP

Aqui também guardamos as cicatrizes de duas experiencias autoritárias, ao longo do século 20, além de inúmeros solavancos e tentativas de golpe. Como reação a esse passado conturbado, a Constituição de 1988 adotou um robusto sistema de cláusulas pétreas, que proíbe a deliberação de propostas de emendas tendentes a “abolir” a democracia, a separação dos Poderes, os direitos fundamentais, bem como a federação.

No contexto desse nosso constitucionalismo defensivo, aprovar uma lei anistiando pessoas condenadas por tentar “abolir” nosso Estado democrático de Direito, como pretendem os assanhados aliados de Bolsonaro, consistiria em uma grave violação à Constituição.

A questão é simples. Se a Constituição proíbe a deliberação de emendas tendentes a “abolir” os princípios fundamentais que a estruturam, como poderia permitir que uma mera lei ordinária assegurasse a impunidade daqueles tentaram “abolir” o Estado democrático de Direito? Evidente que essa lei seria inconstitucional.

Mas não se trata apenas de uma questão formal. A condição básica para que as democracias sobrevivam é que os vitoriosos nas urnas governem de acordo com a Constituição e os derrotados sigam para a oposição, enquanto aguardam as próximas eleições. O compromisso com as regras do jogo é, portanto, indispensável. Ao abrir a possibilidade de anistia para aqueles que conspiram contra essas regras básicas da democracia, a própria sobrevivência democrática fica comprometida.

Não procede a ideia de que a anistia contribuiria para a pacificação e reconciliação nacional. Isso apenas fomentaria a disposição de setores autoritários de continuar atentando contra o resultado das urnas todas as vezes que esses resultados lhes forem adversos. Mais do que isso, também fomentaria os vencedores a exercer o poder à margem dos limites estabelecidos pela lei e pela Constituição, sob a certeza de que ficarão impunes no futuro.

Se existe uma percepção de que a lei de Defesa do Estado Democrático de Direito, ironicamente sancionada por Jair Bolsonaro, em 2021, estabeleceu penas muito rigorosas ou de que o Supremo não distinguiu corretamente as condutas de cada um dos condenados, cumpre ao Congresso Nacional corrigir a lei, para que as sentenças possam ser eventualmente revistas, mas jamais promover a impunidade dos inimigos da nação.

É preciso ter clareza que tentar abolir o Estado democrático de Direito, assim como depor um governante legitimamente eleito, constituem condutas gravíssimas. Quem não tiver compreensão sobre as consequências da erosão do regime democrático deveria ser convidado a passar uma temporada na Venezuela ou na Rússia, para refletir sobre a natureza perversa dos regimes autoritários.

 

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